Fonte: Diário
de Notícias - www.dn.pt
Foi no dia 30 de Setembro de 1939, na cidade de Cienfuegos, que Oscar Aragon Cantero,
depois de ter terminado o seu trabalho, se reuniu com sete amigos para a apresentação
pública da então chamada Rítmica de 39. Cordas, sopros, percussões e vozes amadoras
juntavam-se pela primeira vez para animar as noites do movimentado porto marítimo das
Caraíbas. Sessenta anos passados, a Rítmica de 39 - que pouco tempo depois mudou o seu
nome para Orquesta Aragon - palmilha as sete partidas do mundo, levando a música
tradicional cubana a quem a quiser ouvir. Esta noite, pelas 21 e 30, estará em Lisboa, no
Grande Auditório da Culturgest.
Verdadeira instituição do son de Cuba e de ritmos afins, a orquestra de Oscar
Aragon continua a manter o nome do seu fundador, mas a sua linhagem entronca, sobretudo,
nas capacidades musicais e organizativas do violinista Rafael Lay, que se responsabilizou
pelo conjunto a partir de 1948, profissionalizando-o, oferecendo-lhe prestígio e
conferindo-lhe personalidade. Lay entrou para a orquestra com apenas 13 anos de idade e,
sete anos depois, devido a uma infecção pulmonar de Oscar Aragon que o obrigou a
afastar-se da música, tomou o seu lugar na direcção.
Então, o que era apenas um grupo de amigos que cantava por gosto e amor à música,
transformou-se, rapidamente, numa das orquestras mais prestigiadas de Cuba. Com os anos 50
e o advento do cha cha cha, surgem as primeiras gravações, os contratos com
editoras americanas, a estreia nas digressões internacionais. É a época de ouro da
Orquesta Aragon, que acaba travada pela Revolução de 1959 e a subida de Fidel Castro ao
poder.
Hoje, o actual director da orquestra, Rafael Lay Bravo, filho e herdeiro da função de
Lay, que morreu num acidente de carro em 1982, com apenas 54 anos, fala desse período,
que acabou por talhar o êxito do conjunto, sem amargura: "Com a revolução, há
grupos e artistas que resolveram sair do país. A Aragon não. Aliás, na sua etapa
cimeira, a Orquesta foi uma embaixatriz da cultura cubana no mundo." Ainda assim,
reconhece que, "depois da Revolução, houve a tendência de tentar apagar tudo o que
era anterior a esse processo. Inclusive a música."
"Mas com o tempo tudo acabou por ir ao seu sítio", acrescenta. "A
música da Revolução era a música de antes da Revolução. A raiz da música cubana é
apenas uma." E como o tempo tanto leva como traz, hoje a Orquesta Aragon volta a
viver tempos de desafogo, e a sua presença, que durante as décadas de 70 e 80 se limitou
a digressões por África e pelos países vizinhos da América Latina, é hoje bastante
requerida na Europa. "Os europeus interessaram-se pela nossa música e isso foi
importante, em todos os sentidos. O nosso campo de acção era o México, a Colmbia,
a Venezuela. Agora andamos há quase quatro anos em digressão pela Europa".
A razão deste novo apogeu sabe-se qual é: a invasão da música cubana tradicional
que se sucedeu ao enorme êxito do projecto Buena Vista Social Club. Lay reconhece-o, e
adianta que muitas das suas estrelas já trabalharam com a Orquesta. E se no palco da
Culturgest elas não vão estar presentes, podemos contar com 13 músicos que procurarão
alegrar a sala com os ritmos caribenhos. Se o espectáculo for tão bom quanto o álbum
recentemente gravado para a Lusafrica, La Charanga Eterna, a noite vai valer a
pena.