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Manuel Maria Carrilho
Ministro da Cultura
Fonte: Diário de Notícias

Programa do Ministério da Cultura
de apoio à Cultura Popular

Manuel Maria Carrilho anunciou uma programa de apoio à cultura popular, que irá partir de um orçamento de 100 mil contos, seguindos-se mais outros 500 mil a partir de verbas comunitárias para os próximos 5 anos.

De acordo com o que o Ministro disse ao Jornal Público, "cultura popular" deve ser entendida "no sentido vago que é de uso corrente", rejeitando uma oposição entre uma cultura popular e outra elitista, referindo-se a uma cultura popular "no sentido institucional do termo, ligada ao quotidiano, manifestações culturais fundamentais para a nossa memória colectiva".

Segundo Carrilho, "Portugal tem 800 bandas filarmónicas, 350 grupos corais, 250 grupos de música tradicional e mais de cem tunas" - alguns dos alvos preferenciais deste programa. Outras entidades que poderão beneficiar do programa de apoio à cultura popular serão escolas de música, grupos de teatro amador, grupos etnográficos, escolas, universidades e investigadores.

O programa tem por objectivo "aumentar o conhecimento da cultura popular", através de projectos de estudo e investigação ou levantamentos etnográficos, acções de formação e apoios à actividade cultural amadora. O Ministério da Cultura irá contribuir sobretudo no apoio a equipamentos - compra de instrumentos para bandas musicais, aquisição de material de som e luz para grupos de teatro, ajudas pontuais para a renovação de espaços culturais.

No próximo mês, Carrilho irá ter uma série de reuniões com cada uma destas delegações regionais do Ministério da Cultura, para começar a definir os contornos da aplicação do programa.

O At-Tambur.com estará atento relativamente aos prazos e passos necessários a dar por forma a se ter acesso a este programa, divulgando oportunamente os processos de candidatura. Voltar ao Topo

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Luis Marques
Fonte: Diário de Notícias

Opinião
Da "cultura popular" à cultura imaterial

Artigo de opinião publicado no Diário de Notícias, por Luís Marques

Comecemos pelo objectivo a atingir: cultura imaterial. Tentemos saber de que consta e qual a sua importância, fixando-nos depois no Programa Cultura Popular - lançado pelo Ministério da Cultura (MC) no dia 14 de Janeiro - e na sua eventual capacidade de intervenção num domínio tão essencial mas, paradoxalmente, tão menosprezado ou subvalorizado pelos sucessivos governos e de que já nos alertavam desde o século passado grandes vultos da nossa História como Herculano, Garrett, Rocha Peixoto, Adolfo Coelho, Teófilo Braga, Carolina Michaëlis, J. Leite de Vasconcelos, Jorge Dias, etc.

Não fazendo parte da quase totalidade dos acervos museológicos e arquivísticos, a cultura imaterial continua condenada ao definhamento e à extinção, dada a ausência de medidas oficiais. Essa constante incapacidade das nossas autoridades ministeriais, esse "esquecimento" por parte dos sucessivos políticos (1), pode-nos levar a interrogar sobre se não estaremos perante algo de nulo interesse, de pura abstracção ou de impossível realização. Porém, não é disso que se trata, mas de insuficiente sensibilidade, conhecimento e vontade política.

De facto, tanta inércia, alheamento, incúria, desresponsabilização e incompreensão tornam-se, cada vez mais, não apenas absurdos, mas igualmente inadmissíveis. Com efeito, desde as oralidades à música, da medicina popular à dança, até à religiosidade popular e aos simbolismos existentes em certos lugares e objectos, tudo isso nos revela o insubstituível e inestimável valor da nossa cultura tradicional, realidade mais do que suficiente para afastar equívocos, eliminar hesitações e permitir avançar com céleres e adequadas medidas. Portugal tem de reconhecer todo o merecimento à literatura popular, seja loa, entremez, provérbio, conto, oração, lenda, auto teatral..., aos rituais colectivos sob a invocação de santos, às hierofanias detectáveis em determinados elementos naturais: fontes, árvores, pedras...; aos cantos de trabalho, às melopeias, aos instrumentos musicais como as violas, campaniça, toeira ou beiroa possuidoras de um inconfundível e delicado toque; às práticas curativas e cautelas supersticiosas e às fórmulas mágicas; a certos bairrismos e rivalidades vizinhas que tanto se detectam numa chega de bois como nas largadas e corridas de touros, seja à corda ou ao forcão; a certos jogos de perícia individual efectuados nos largos das aldeias e em adros de igrejas...

O que falta inventariar e documentar de forma sistemática é imenso e as medidas incentivadoras e coordenadoras têm de partir do poder central. O mais tarde, em certos casos, pode ser demasiado tarde. Um instituto constituído numa perspectiva desburocratizada - e sem perder o mínimo sentido da responsabilidade -, virado essencialmente para o trabalho de campo, para a recolha etnográfica, é desejável e possível. As delegações regionais do MC, revalorizadas com a componente antropológica de actuação, poderiam ser uma também boa alternativa à situação paralisante e nefasta em que se encontra o nosso património incorpóreo.

Aliás, a este propósito, faz todo o sentido que uma região como Lisboa e vale do Tejo venha a dispor de uma delegação regional. Facto tanto mais urgente quanto sabemos encontrar-se aqui - para além de uma significativa presença multicultural, pluriétnica e multirracial - uma vasta população autóctone estremenha e ribatejana, cujas raízes culturais importa pesquisar e revalorizar.

É verdade que numa das três propostas do Programa Cultura Popular se pretende apoiar "projectos de estudo e investigação, levantamentos monográficos e etnográficos", o que é inovador e de elogiar, mas que não pode excluir nem eliminar a responsabilidade do Estado na elaboração de uma política de defesa do património cultural onde a cultura imaterial se insira. Este recente estímulo à participação particular e individual é louvável, mas nunca poderá substituir o papel do Estado enquanto garante da nossa identidade nacional. Se até hoje nada se tem feito oficialmente de forma planeada e sistemática, e sendo este programa uma medida positiva, isso não deve excluir a necessidade de o Governo vir a complementá-la, posteriormente, e tão rápido quanto possível, assumindo por inteiro, finalmente, a sua responsabilidade nesta matéria. É com isso que contamos, mesmo que não ignoremos que as verbas agora disponibilizadas para o conjunto do programa, nesta fase inicial, sejam escassíssimas (cem mil contos) e venha ou não, em breve, a ser aprovada na AR a Lei-Quadro do Património Cultural.

Por último, uma breve alusão à terminologia cultura popular, que, como se sabe, remete de imediato para a dicotomia cultura popular/cultura elitista. Porque sabemos que o espírito que anima este programa (mesmo que muito mitigadamente) é o de dinamizar a cultura local por intermédio do fomento da investigação, da formação e da melhoria das infra-estruturas vocacionadas para a acção artístico-cultural, não consideramos aquela expressão uma concepção passadista e paternalista, menorizadora das forças laborais e do povo em geral, nem lhe atribuímos a capacidade de apenas produzir subprodutos criativos, objectos de tipo artístico - na melhor asserção, exclusivamente artesanais -, tal como o concebia a política do anterior regime, nomeadamente através da FNAT e dos seus serões para trabalhadores ou das suas exposições de arte, que compreendiam "expressões de uma poesia primitiva e simples... e até formas pitorescamente caricaturais".

Daí que neste contexto nos pareça oportuno o desenvolvimento de uma política mais estreita com os ministérios da Educação e da Ciência, designadamente no sentido de propiciar condições mais favoráveis à actividade dos centros de estudos e institutos universitários, sendo certo que nem a iniciativa particular e privada nem as autarquias, por si só, dispõem de competência, orientação, meios técnicos e humanos passíveis de enfrentar com êxito as imensas carências que neste âmbito o País enfrenta.

(1) Salvo a honrosa excepção de F. Lucas Pires quando deteve a pasta da Cultura e que foi responsável pela salvaguarda dos arquivos do etnomusicólogo Michel Giacometti, um dos maiores defensores do nosso património cultural.

Luís Marques é antropólogo

 

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