Título: O Romanceiro Português de Tradição Oral Moderna - I Volume
Organizador:
Pere Ferré da Ponte
Editor:
Fundação Calouste Gulbenkian
552 págs., 3000$00 (ao público); 2000$00 (estudantes e professores) |
Edição do Romanceiro
Português
Enfim, o Sonho de Garrett
Editado Por Carlos Câmara Leme - Jornal Público
em 30 de Março de 2000
No princípio, à imagem do paradigma de Walter Scott, foi Almeida Garrett quando entre
1843 e 1851 publicou os três volumes do seu "Romanceiro". Até ao trabalho
chegar ao I volume do "Romanceiro Português de Tradição Oral Moderna",
organizado por Pere Ferré da Ponte, um catalão de 47 anos, muita água passou por
debaixo das pontes... Depois do autor de "Viagens na Minha Terra" foi preciso
esperar por vários inovadores e emblemáticos trabalhos - de José Leite de Vasconcelos
e, no que diz respeito à estrutura filológica, da obra por Carolina Michaëlis de
Vasconcelos.
O século XX mudou, porém, o rumo teórico da obra em Portugal. Como sublinhou aquele
investigador, "se aquilo que moveu a primitiva crítica do século XIX foi a procura
de uma identidade nacional, através das culturas preservadas na memória" começou
lentamente a perceber-se que "por maiores que fossem as especificidades das versões
portuguesas os temas inseriam-se numa mais profunda tradição, ora pan-europeia ora
pan-hispânica".
Até chegar aos dias de hoje, outras alterações se verificaram - oriundas sobretudo das
investigações na literatura comparada e da não menos importante vertente oral,
nomeadamente os poemas narrativos de proveniência popular - que não eram tidos em linha
de conta na literatura portuguesa. "Um provincianismo crítico, associado a um
elitismo ignorante" nas palavras de Ferré da Ponte, foram também ultrapassados.
Claro: nem tudo são rosas. Pelo contrário. O investigador não esteve com meias tintas:
"Se neste momento podemos afirmar que o romanceiro de expressão castelhana, a até
mesmo galega ou sefardita, apresenta um vastíssimo corpus bibliográfico, paradoxalmente,
Catalunha e Portugal, as nações culturais que mais contribuíram, ao longo do século
XIX, para o conhecimento deste género, permanecem consideravelmente excluídas" dos
estudos internacionais.
Se mais nenhuma razão existisse, só esta dá que pensar: Portugal continua em muitos
aspectos a ver passar navios e marinheiros... Mas nem tudo são adversidades. Ferré
quando em 1980 pegou na obra, encontrou pelo caminho Maria Aliete Galhoz e "umas
preciosas fichas bibliográficas" da investigadora. Depois, aproveitou a boleia do
Instituto de Estudos do Romanceiro Velho e Tradicional, criado pelo investigador em 1989,
e dos estudos de Cristina Carinhas.
Resultado? Hoje podemos contar com dois grandes arquivos com cerca de 11 mil documentos,
de versões impressas entre 1828 e 1997, e outro com 4 mil versões - ainda inéditas -
algumas das quais "graças à oferta de colecções particulares". O primeiro
volume agora dado à estampa reúne parte dos romances tradicionais profanos, o segundo
tomo acolherá os romances de milagres e vulgares e, finalmente, o terceiro reunirá os
romances religiosos. Almeida Garrett, onde quer que esteja, ficará com certeza
satisfeito.
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